A urgência da diversidade racial nos setores público e privado
Encontro Continental de Estudos Afro-Latino-Americanos, realizado por Instituto da Harvard pela primeira vez no Brasil, reforçou o compromisso coletivo com a equidade racial
A diversidade racial em cargos de liderança é um tema de crescente importância no cenário global. Estudos e dados estatísticos revelam uma sub-representação significativa de pessoas negras, indígenas e outras minorias étnicas em posições de liderança em diversas áreas, incluindo setores corporativos, governamentais e acadêmicos. A promoção da diversidade racial não é apenas uma questão de justiça social, mas também uma estratégia que pode trazer benefícios econômicos e sociais, melhor tomada de decisões e maior representatividade.
Entre os dias 10 e 12 de julho aconteceu o III Encontro Continental de Estudos Afro-Latino-Americanos, realizado pelo Afro-Latin American Research Institute at Harvard University (ALARI), na Universidade de São Paulo. Essa foi a primeira vez que o encontro ocorreu em uma cidade na América Latina. O evento reuniu professores, alunos, pesquisadores, acadêmicos, ativistas, artistas e formuladores de políticas públicas, que trabalham com comunidades afrodescendentes na região.
Eloya Porto, coordenadora de equidade racial da Fundação Lemann, esteve presente e acompanhou a mesa redonda “Cotas Raciais no Funcionalismo público”, que abordou diversos aspectos das políticas de equidade racial, avanços e desafios, e estratégias para políticas afirmativas. A conversa contou com a participação de Alessandra Benedito, Vice-Presidente de Equidade Racial da Fundação Lemann, Teboho Moja, professora da New York University, Pedro Masson, representante da ENAP, Nailah Neves, representante do Ministério da Igualdade Racial, Wescrey Portes Pereira, pesquisador, e Luiz Augusto Campos, representante do GEMMA. Segundo Eloya, em um post no Linkedin, o painel mostrou como ainda é falha a lei de cotas no Serviço Público brasileiro, abordou os desafios para aprovar leis relacionadas à pauta racial no Congresso, e destacou a importância da inclusão de quilombolas, povos de terreiro e ribeirinhos, grupos que historicamente enfrentam desafios específicos em termos de acesso à educação, saúde e oportunidades de emprego.
Segundo Alessandra Benedito, um dos assuntos importantes abordados no painel foi sobre os mecanismos usados para garantir que as políticas de cotas sejam aplicadas de maneira justa e precisa por meio das bancas de heteroclassificação, que observam e avaliam características fenotípicas (aparência física) do candidato, e heteroidentificação, que também avalia as características fenotípicas, mas pode incluir outros elementos contextuais, como documentos históricos, relatos de vivências e aspectos culturais. Essas comissões podem, assim, garantir a aplicação correta de políticas de cotas raciais, que contribuem para corrigir desigualdades históricas.
Para que essas bancas sejam assertivas, garantindo que as políticas de cotas sejam aplicadas de maneira justa e eficaz, é importante que sejam implementadas metodologias unificadas e padronizadas, com diretrizes claras e objetivas, treinamento dos membros das bancas e o uso de tecnologias que auxiliem na identificação e validação das autoidentificações raciais. “Hoje, cada banca faz a análise de um jeito. Umas são presenciais, outras online, algumas feitas por fotografia, e o debate público não avança nesse sentido”, diz a Vice-Presidente de Equidade Racial da Fundação Lemann.
Embora as cotas tenham permitido avanços significativos nos últimos anos, é essencial expandir e aprofundar essas ações afirmativas para incluir todos os grupos minorizados nos setores público e privado. “Nailah Neves deixou clara a ideia de que dentro das políticas de cota é possível trabalhar as políticas sociais, mas não necessariamente dentro das políticas sociais você consegue trabalhar as políticas de cota no nível em que elas precisam ser tratadas”, completa Adriana.
O encontro do ALARI reforçou o compromisso coletivo com a equidade racial, além de promover o campo acadêmico dos Estudos Afro-Latino-Americanos, por meio de diálogos entre os atores envolvidos na produção e implementação de agendas acadêmicas e de justiça racial na América Latina. Ficou claro como a responsabilidade pela promoção da diversidade racial em cargos de liderança deve ser compartilhada entre o Estado, com um papel crucial na criação de políticas públicas que promovam a inclusão racial, e a iniciativa privada, que tem a responsabilidade de promover ambientes de trabalho inclusivos e diversificados. Assim como é fundamental a formação de líderes engajados com causas sociais para uma transformação positiva do país, o que inclui a diversidade racial.