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25 maio 2023 | 16h12

Brasil vai mal em prova internacional de leitura – e o foco em alfabetização é a saída

Opinião - Daniela Caldeirinha, diretora de Alfabetização

Na semana passada, saiu o resultado do Pirls, um estudo internacional que avalia o progresso em leitura de alunos do 4º ano do Ensino Fundamental. Foi a primeira vez que estudantes brasileiros participaram da avaliação, ao lado de alunos de outros 56 países. Os resultados são bastantes preocupantes: o Brasil ficou entre os últimos, à frente apenas da Jordânia, do Egito e da África do Sul. Trocando em miúdos, cerca de 75% das crianças brasileiras de 10 anos estão atrás da média de praticamente todos os países desenvolvidos que fizeram a avaliação. 

Para analisar melhor o estudo, vale entender o que o Pirls (sigla em inglês para Progress in International Reading Literacy Study) define como “letramento em leitura”: “a habilidade de entender e utilizar as formas da linguagem escrita exigidas pela sociedade e/ou valorizadas pelo indivíduo”. Assim, os leitores são aptos a “construir sentido a partir de textos em uma variedade de formas” e “leem para aprender, para participar de comunidades de leitores na escola e na vida diária e por prazer”. É justamente essa etapa, tão fundamental para seu desenvolvimento, que as crianças não atingem quando não aprendem a ler devidamente. O IEDE fez um material super interessante sobre o exame e o desempenho brasileiro. Recomendo a leitura.   

No Brasil, a avaliação foi aplicada a 4.941 estudantes do 4º ano do Fundamental, quando o aluno tem 10 anos. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), no entanto, prevê que as crianças estejam alfabetizadas antes, ao final do 2º ano. Os baixos resultados que vemos no 4º ano, portanto, são um sinal de que a missão na primeira etapa não foi cumprida. Se não investirmos na alfabetização até o final do 2º ano, nunca vamos alcançar bons resultados em avaliações como essa. Quando não garantimos as habilidades de leitura para as crianças no ponto inicial da trajetória escolar, todo o aprendizado dos anos seguintes (e em todas as áreas de conhecimento) é prejudicado.

O Pirls foi aplicado em 2021, ou seja, em meio à pandemia de Covid-19, que teve impactos inequívocos sobre a educação. Também em 2021, o Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) para o 2º ano mostrou uma queda terrível no patamar da alfabetização no Brasil – saímos de 49% para 31% de crianças alfabetizadas na idade certa. É preciso lembrar, porém, que 49% já não era um índice bom. O mesmo Saeb revelou ainda que 79% dos estudantes brasileiros não atingiram o nível adequado de alfabetização. A pandemia aprofundou, sim, o problema, mas é verdade que a questão era gravíssima antes.

Uma pista de que a recuperação pode ser rápida vem dos 16 estados parceiros da Parc (Parceria pela Alfabetização em Regime de Colaboração - iniciativa da Fundação Lemann, Instituto Natura e Associação Bem Comum). Numa avaliação de fluência leitora com 300 mil crianças realizada ao final de  2022, ficamos muito perto de alcançar os patamares de 2019, o que mostra que o tombo foi grande, mas a recuperação pode ser acelerada dependendo do esforço e da intencionalidade investida nesse processo.

Os resultados do Pirls reforçam que a alfabetização precisa ser uma prioridade para o Brasil. A próxima avaliação está marcada para 2026 e, até lá, o país tem a oportunidade de planejar e investir com foco a fim de oferecer aos alunos brasileiros condições para que alcancem posições melhores. Desde o início do ano, o Ministério da Educação vem anunciando que esta será uma pauta prioritária, e estamos todos na expectativa para que uma política que materialize essa necessidade seja lançada em breve. O fato de a tendência de recuperação da aprendizagem ser mais rápida nos estados em que existem políticas de alfabetização em colaboração com os municípios é uma pista. Não é tarefa simples, mas a mobilização conjunta em torno de políticas públicas específicas, articuladas e direcionadas para essa etapa indicam um caminho para mudar esse cenário. Se a alfabetização for tratada como prioridade da mais alta liderança até a sala de aula, vamos conseguir avançar.  

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