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11 fevereiro 2025 | 00h00

Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência: desafios, conquistas e equidade

Pesquisadoras que fazem parte da Rede de Líderes da Fundação Lemann compartilham suas experiências e reflexões sobre a trajetória feminina na ciência

No dia 11 de fevereiro, é celebrado o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, uma data criada pela ONU para destacar a importância da participação feminina no avanço científico e tecnológico. 

Atualmente, as mulheres representam praticamente metade da produção científica brasileira. Segundo o relatório da Elsevier-Bori “Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil”, de 2024, nos últimos 20 anos, a proporção de pesquisadoras que assinam publicações científicas no país saltou de 38% para 49%. O Brasil é o terceiro colocado na lista dos locais com maior participação feminina na ciência, que conta com 18 países mais a União Europeia. Argentina e Portugal ocupam os primeiros lugares no ranking, ambos com 52% de mulheres como autoras dos artigos.

Apesar dos avanços, ainda existem muitos desafios a serem superados. É necessário buscar mais equilíbrio independentemente do tempo de experiência das pesquisadoras. À medida que a carreira avança, há uma redução na presença de mulheres, especialmente quando abordamos a equidade de oportunidades para ocupar cargos de liderança. Nas patentes de inovação, por exemplo, o relatório aponta que os homens continuam acumulando muito mais direitos do que as mulheres.


Conquistas e barreiras estruturais

Para entender melhor essa realidade, conversamos com duas pesquisadoras que fazem parte da Rede de Líderes Fundação Lemann, grupo que reúne lideranças de diversas áreas comprometidas com transformações no Brasil. Carla Ribeiro Polycarpo, professora da UFRJ e PhD em Microbiologia, e Sabine Righetti, pesquisadora do Labjor-Unicamp e cofundadora da Agência Bori (responsável pelo relatório citado acima), compartilharam suas experiências e reflexões sobre a trajetória das mulheres na ciência.

Carla conta que, desde pequena, tinha vontade de trabalhar na área. Aos 11 anos, ouviu falar sobre o Projeto Genoma Humano. 'Eu adorava as aulas de Ciências e Genética e, desde então, decidi que queria ser cientista.' Hoje, ela reconhece que, para seguir carreira como pesquisadora, é fundamental contar com o apoio de outras mulheres, de forma colaborativa e não hierárquica”.

Ao longo da história, as mulheres enfrentaram e ainda enfrentam barreiras significativas para avançar na ciência. Além dos desafios acadêmicos, a desigualdade de gênero se manifesta na precariedade de infraestrutura, na falta de oportunidades no setor privado e, principalmente, na dificuldade de conciliar a carreira científica com a maternidade. Carla Ribeiro aponta que a instabilidade da profissão e a falta de apoio estruturado tornam o caminho mais árduo para as mulheres. “Começamos como docentes na universidade com alunos de graduação. A maioria faz Iniciação científica e não fica para mestrado e doutorado. Hoje em dia, devido ao baixo valor das bolsas e incerteza para o futuro, a pós-graduação está cada vez menos atrativa. Então, o processo de construção de um grupo de pesquisa é realmente lento. Se você se torna mãe, fica ainda mais complicado. A maternidade pode significar uma pausa na produtividade e, sem publicar, você perde chances de financiamento. O custo emocional é muito alto”, relata.

Sabine lembra também que a presença feminina nos cargos de liderança ainda é pequena. As universidades e instituições de ciência ainda são lideradas majoritariamente por homens. “O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação só teve uma ministra mulher pela primeira vez em 2023. O CNPq, principal agência de fomento, nunca teve uma presidente mulher. Quando você olha para os espaços de liderança e só vê homens brancos, isso se torna um grande desafio. Eu nunca fui orientada por mulheres, todos homens brancos.” Seu objetivo na Agência Bori é pautar a imprensa nacional por meio da divulgação de pesquisas brasileiras, para tornar o conhecimento científico acessível para sociedade.


Rede de apoio e mudanças necessárias

Iniciativas como a Rede de Líderes Fundação Lemann e organizações voltadas para equidade, como o Parent in Science, movimento dedicado a apoiar mães e pais na ciência, têm contribuído para apoiar pesquisadoras em sua trajetória. Carla destaca que sua participação na Rede foi fundamental para ampliar suas perspectivas e inspirar novos talentos. “Acho que minha maior contribuição foi servir de exemplo para outras mulheres que querem seguir a carreira científica. Acredito que o panorama está mudando, principalmente devido às cientistas mais jovens, que se posicionam muito melhor.”

Entre as mudanças necessárias para aumentar a presença feminina na ciência, Sabine enfatiza a importância de políticas públicas mais inclusivas e o fortalecimento de debates sobre gênero na ciência. “Hoje, falamos sobre esses desafios. Quando comecei minha carreira, nem se falava disso. É um ponto para se celebrar e para se lembrar que a gente ainda tem que discutir onde estão as mulheres em cargos de liderança, onde estão as mulheres negras, e acredito que é um tema que a gente ainda vai trabalhar por muito tempo e eu vou trabalhar sempre”, diz.


Inspirando as próximas gerações

Para que mais meninas se sintam encorajadas a entrar no mundo da ciência, a visibilidade de mulheres cientistas é essencial. Carla menciona grandes nomes da pesquisa brasileira, como Alicia Kowaltowski, Débora Foguel, Fernanda de Felice e Mayana Zatz, reforçando que, apesar dos desafios, é possível construir uma carreira científica de impacto. Seu conselho para jovens cientistas é buscar o próprio espaço. “É preciso se colocar, sempre. Não achar que sua opinião é menos importante. Busque apoio em outras mulheres. É difícil competir com homens, eles têm mais tempo. Mas, se as políticas ajudarem, e nós temos que correr atrás disso, é possível. E também não acho que tem que desistir de ser mãe para ter uma carreira legal. Temos que ter apoio para fazer tudo que quisermos.”

Essa data é uma oportunidade de celebrar as conquistas das pesquisadoras que vêm transformando o cenário científico brasileiro e reforçar a importância de continuar lutando por um ambiente mais igualitário e acessível para todas. 

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